O materialismo evolucionista e o espiritualismo dão origem às dualidades de pensamentos existentes em relação ao papel real da família. No conceito materialista, a família resulta de uma mera convenção momentânea ou do encontro sexual do homem e da mulher. Nessa concepção, o ser humano é apenas o último elo da cadeia zoológica, em que tudo se assemelha aos outros animais e, como tal, regido pelas mesmas leis. O estado primitivo desse ideal de “família” é o da animalidade pura, em que o casamento não existe senão numa forma indeterminada ou embrionária de absoluta promiscuidade carnal. Embora altamente insuflado nos tempos atuais, tal concepção materialista representa simplesmente urna involução da humanidade, e urna decadência moral, ética e espiritual do ser humano, onde os prazeres são colocados em primeiro lugar dentre as prioridades do casal.

Por outro lado, na concepção espiritualista, a família não é a resultante da evolução humana ou busca de prazeres, é, entretanto, uma associação de origem divina, fundada por Deus e revestida de caráter sagrado. A família, consoante à primeira destas orientações filosóficas, resulta de uma série quase infinita de transformações da matéria que, passando de estados inferiores a estados superiores, foi adquirindo progressivamente graus cada vez mais elevados na escala da perfeição, rumo ao Sagrado.

A família, portanto, resulta de uma tendência natural e estável que molda o homem a viver em sociedade. Muito além disso, o homem é impulsionado por uma inclinação natural em prolongar a sua existência noutros indivíduos da sua espécie, isto é, nos seus filhos. Sendo assim, a família é a possibilidade de uma continuidade histórica, podendo manter viva as tradições, costumes e heranças culturais de regiões, povos e civilizações. Estas tendências de continuidade e conservação ficam perfeitamente satisfeitas na família cristã que é a forma mais perfeita da sociedade doméstica.

Na família, em função da sociedade civil, o homem encontra todos os requisitos necessários ao desenvolvimento dos processos da geração e educação da prole. Levados por essa intenção, o casal se une por um contrato livre e estável, para viver uma vida comum, em que ambos participam igualmente da felicidade ou da infelicidade que em dias porvindouros venham alegrar ou entristecer-lhes. Desta união, ficam integrados perante a vida mais simples, amorosa e pura que o Criador lhes destinou. Começaram assim, a aparecer os filhos, frutos últimos do amor conjugal, e das bênçãos divinas. Existe agora uma família no sentido mais estrito, completo e perfeito.

Tudo isso tem por base o amor. O amor é a base que guia a união conjugal, o desenvolvimento e o aperfeiçoamento dos filhos. É a base da decisão de fazê-los eficientes e capazes de vencer as dificuldades da vida. E assim consegue Deus realizar os seus intentos no mundo, mediante as inclinações naturais de seus filhos. Amor é um modo de ser, é, como dizia Jesus, morrer pelo ser amado. Amar é odiar o pecado do ser amado; é odiar a possibilidade de danação do ser amado; é o fazer de tudo pelo ser amado e perceber que não fez absolutamente nada e faria muito mais. Amar é santificar o ser amado, independente das dificuldades. Segundo Camões, amor é estar preso por vontade e ter com quem nos mata lealdade.

Os bons efeitos sociais emanam naturalmente da boa formação moral e religiosa dos filhos, num ambiente calmo do lar doméstico, de onde saem os futuros condutores do ser humano, os caracteres imaleáveis e os espíritos puros e santos. Uma educação completa do homem, norteada pelos ditames da consciência reta e pelos preceitos da religião cristã verdadeira, transforma-o na mais eficiente garantia de uma sociedade livre, fiel, igualitária e justa. Tudo isto são os resultados da educação moral, religiosa e física que aperfeiçoou as coragens dos filhos pelo amor filial, estendendo-o até ao amor patriótico. O amor que os filhos dedicam aos pais invade o lar, ultrapassa-lhe as raias caseiras, comunica-se com seus iguais e alarga-se pela sociedade inteira.

O matrimônio é o símbolo da união mística existente entre Cristo e a família. Como esta união é de todas a mais íntima, a mais santa e a mais frutuosa, o matrimônio possui também as suas dificuldades, sendo elas enraizadas na fé, na constância, na entrega, na servidão, na fortaleza e na santificação do lar. Por isso, havemos de encontrar na família, a indissolubilidade, a unidade, e a fecundidade.

Imitemos em nossos lares, caro leitor, a santa perfeição do lar de Nazaré, onde transbordava em todos os ângulos a virtude, o amor e a santidade. Encontram-se nele todas as condições necessárias à vida da família: o perfeito amor dos cônjuges, a obediência, o trabalho, a caridade e a esperança; enfim, a prece, pela qual a família se une a Deus, que é a sua felicidade eterna e o amor.

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